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Publicado em 07 de Agosto de 2023 às 15:10 em Estudos Médico Tiroide | 0 comentários

Doença Nodular da Tiroide: Breve Revisão do Diagnóstico e Terapêutica

Doença Nodular da Tiroide: Breve Revisão do Diagnóstico e Terapêutica

Inês Sapinho
Endocrinologista
– Coordenadora do Serviço de Endocrinologia e da Unidade da Tiroide do Hospital CUF Descobertas;
– Endocrinologista do Centro de Dermatologia de Lisboa e do Hospital Particular do Alentejo;
– Autora do livro “Os Segredos da Sua Tiroide”.

Miguel Allen
Cirurgião Consultor de Cirurgia Endócrina
– Coordenador da Cirurgia Endócrina do Hospital da Luz Lisboa e Oeiras;
Fellow do European Board of Surgery – Endocrine Division.

 

Perceber como lidar com o aumento do diagnóstico de doença nodular da tiroide é, na nossa opinião, fundamental para haver uma relação custo-benefício eficaz e não aumentar a ansiedade do doente e familiares. Consideramos, também, ser importante evidenciar o desenvolvimento científico e tecnológico na abordagem desta doença que, nos últimos anos, permitiu diminuir o risco da cirurgia e melhorar o prognóstico. A existência de equipas multidisciplinares tem sido crucial na adequada abordagem de cada doente.

Os nódulos da tiroide são um achado comum, sobretudo nas mulheres, sendo estimado que 4% a 7% da população tenha um nódulo palpável, embora estes números atinjam 30% a 60%, se o diagnóstico for ecográfico. Na maioria dos casos os nódulos da tiroide são benignos, sendo cerca de 4% a 6,5% malignos. 

Os fatores de risco mais importantes são o sexo feminino (94% dos casos), idade avançada, história familiar de nódulos da tiroide, irradiação prévia da cabeça e do pescoço, deficiência em iodo e a gravidez.

 

As manifestações do problema…

A grande maioria dos nódulos são assintomáticos. No entanto, alguns podem estar associados a sintomas compressivos, provocando rouquidão, tosse irritativa, dispneia ou disfagia. A dor é rara e está habitualmente associada a hemorragia intranodular, com crescimento rápido do nódulo, sendo esta situação aguda, por vezes, o episódio que leva ao diagnóstico.

Estando, na maioria dos casos, a função tiroideia normal, a história clínica e exame objetivo podem orientar quanto ao grau de suspeita de malignidade, mas não são, naturalmente, suficientes. Na palpação cervical, a avaliação das características do(s) nódulo(s) (tamanho, consistência, mobilidade e sensibilidade) é muito importante, assim como avaliar a presença de gânglios cervicais. Seja um nódulo único ou bócio multinodular, a probabilidade de malignidade é igual, em função das características individuais e não é o nódulo de maiores dimensões que tem obrigatoriamente maior risco.

Os dados importantes da história clínica e do exame objetivo que aumentam a suspeita de malignidade são: história familiar de doença maligna da tiroide; história pessoal de radiação da cabeça e do pescoço; crescimento da massa; rouquidão, disfagia ou dispneia; consistência dura, fixo aos tecidos adjacentes; gânglios cervicais; e idade inferior a 20 ou superior a 70 anos.

 

Que exames devem ser pedidos na presença de nódulos da tiroide?

Todos os doentes com nódulos da tiroide devem fazer análises com o doseamento de TSH, pois, se estiver diminuída ou no limite inferior do normal, pode indicar que se trata de um nódulo hiperfuncionante, que na maioria dos casos será benigno e pode não necessitar de citologia, devendo ser realizada uma cintigrafia da tiroide. 

No caso da TSH ser normal ou elevada, a ecografia é o melhor exame de imagem para avaliar com precisão as características dos nódulos, restante tiroide e gânglios cervicais. É a descrição ecográfica dos nódulos que vai permitir tomar uma decisão quanto à indicação para citologia.

As características ecográficas de suspeição que aumentam o risco de malignidade são: microcalcificações, margens irregulares, hipervascularização intranodular caótica, nódulo sólido, bastante hipoecogénico, com perda de halo periférico, ou presença de gânglios regionais suspeitos. Estas características não permitem distinguir, com certeza, as lesões benignas das malignas, sendo os nódulos classificados quanto ao risco de malignidade (EU-TIRADS), o que permite decidir e orientar para procedimentos de diagnóstico (citologia aspirativa com agulha fina – CAAF), terapêuticos (aspiração de quistos) ou para a monitorização dos nódulos ao longo do tempo.

É, portanto, o resultado da CAAF que, quando indicada, permite atribuir uma probabilidade de malignidade, de acordo com a classificação internacionalmente adotada (Classificação de Bethesda) e permite decidir pela melhor forma de tratamento.

Do ponto de vista cirúrgico, nos nódulos assintomáticos com menos de 3,5-4 cm e cuja CAAF foi benigna, deixa de haver uma preocupação premente, devendo a tiroide ser vigiada com avaliação da função e ecografia, realizada entre seis a 12 meses.

A cirurgia está indicada: no caso de nódulos com CAAF benigna superiores a 4 cm (discutível caso a caso); quando a CAAF é diagnóstica ou suspeita de malignidade; quando a CAAF é de tumor folicular, em nódulo não hiperfuncionante; no bócio nodular tóxico; quando há sintomas compressivos; ou ainda por questões estéticas e preferência da(o) doente.

Sendo uma cirurgia de elevada minúcia anatómica e com potenciais riscos de complicações com impacto na qualidade de vida do doente (sobretudo na sua voz), é essencial que seja realizada por um cirurgião experiente e, de preferência, num centro especializado. Para um cirurgião ser considerado como experiente em cirurgia endócrina cervical deverá realizar mais de 50 tiroidectomias por ano. 

A técnica cirúrgica atual, com recurso a lupas, luz frontal e equipamento moderno de selagem e corte, permite a realização de incisões muito reduzidas, ficando disfarçadas numa das pregas cervicais de expressão, na maioria dos casos em ambulatório ou com um dia de internamento. Para os doentes que não queiram qualquer cicatriz cervical e embora nem todos os casos sejam adequados, nos últimos anos têm sido desenvolvidas técnicas que recorrem a incisões fora do pescoço. 

Outras técnicas recentes de tratamento da patologia nodular benigna são a ablação percutânea por radiofrequência, micro-ondas ou laser e ainda a injeção de álcool. Estes são procedimentos realizados em ambulatório, que permitem uma progressiva redução volumétrica nos meses seguintes e que poderão reduzir a necessidade de intervenção cirúrgica em casos selecionados. A sua maior limitação é a inexistência de material para análise histológica, pelo que deverá ser apenas reservada para os casos em que não haja qualquer suspeita imagiológica e citológica de malignidade.

As complicações cirúrgicas mais importantes (além do seroma, infeção e hemorragia cervical, que pode causar dificuldade respiratória, mas que é muito rara) são as alterações temporárias ou permanentes da voz e do cálcio.

Quanto à voz, há que ter noção que existem dois nervos principais, milimétricos em diâmetro, que permitem a mobilidade e tensão das cordas vocais: o nervo laríngeo inferior “recorrente” e o ramo externo do nervo laríngeo superior.

Para minimizar esta possibilidade de lesão neuronal, o recurso a uma técnica de neuromonitorização intraoperatória tem sido muito importante, sendo mais notório esse benefício quanto mais exigente e complexo for o caso.

A reposição da hormona tiroideia (levotiroxina), imprescindível após uma tiroidectomia total, é necessária em cerca de 30% após uma hemitiroidectomia. 

Como conclusão, queremos salientar que, apesar do aumento significativo do diagnóstico de nódulos da tiroide, a incidência de morbilidade associada ao seu tratamento não aumentou, tendo para tal contribuído a abordagem por equipas multidisciplinares, com diferenciação científica e tecnológica. 

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